Disciplina - Sociologia

Sociologia

16/04/2010

Brasília contrasta riqueza e desigualdade após quase 50 anos

Por Raquel Maldonado
Enquanto Brasília ostenta uma das maiores rendas per capita e o melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país (considerando-se toda a região metropolitana), ela amarga o título de 16ª cidade mais desigual do mundo e a 4ª mais desigual do Brasil, segundo relatório divulgado recentemente pela ONU (Organização das Nações Unidas).
Os limites de Brasília ainda causam certa confusão. Para alguns, Brasília corresponderia apenas à área de uma das 30 regiões administrativas que compõem o Distrito Federal: o conhecido Plano Piloto. Entretanto, órgãos como a ONU e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) quando se referem a Brasília levam em consideração as informações de todas as regiões administrativas, que, juntas, têm uma população de 2.606.885 habitantes (número de 2009).
Apesar da desigualdade social, os indicadores socioeconômicos destas 30 regiões se assemelham aos de países de primeiro mundo. Os números mostram que a região está em uma situação bastante privilegiada em relação às outras unidades federativas brasileiras, principalmente pela infraestrutura (acesso à saúde, educação e saneamento básico) oferecida aos cidadãos.
Segundo informações do IBGE referentes ao ano de 2008, 98,2% dos domicílios urbanos do DF têm o lixo coletado, 95,4% estão ligados à rede geral de abastecimento de água e 99,8% têm ligação direta com a rede geral de esgoto. A cobertura de energia elétrica já cobre 100% dos domicílios.
Entretanto, um estudo elaborado pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan) com dados de 2004 constata a desigualdade apontada pela ONU. Enquanto em 2004 a renda domiciliar de 33,4% dos domicílios das cinco regiões administrativas com maior poder aquisitivo (Lago Sul, Sudoeste/Octogonal, Lago Norte, Brasília e Park Way) se caracterizava por rendimentos superiores a 20 salários mínimos, apenas 0,1% dos domicílios das duas regiões administrativas mais pobres (Estrutural e Itapoã) registravam o mesmo rendimento mensal.
"Brasília é um representativo das desigualdades registradas no Brasil inteiro", afirma o pesquisador Brasilmar Ferreira Nunes, autor do livro "A Fantasia Corporificada", que destaca as diferenças profundas entre todas as regiões administrativas do DF.
Para Clovis Scherer, supervisor técnico do escritório do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos) no DF, Brasília tem um histórico de desigualdade. “Muitas das pessoas que trabalharam na construção da capital ficaram por lá atraídas por melhores condições de emprego e moradia. Por serem menos qualificadas, elas não conseguiram entrar para o setor público, então ficaram na cidade tentando a sorte”.
Maria Piedade Morais, pesquisadora do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), afirma que o fato de Brasília ser uma área nova e bastante dinâmica pode ser considerado um dos geradores de desigualdade. “Áreas com estas características atraem muitas pessoas de outros Estados que buscam melhores condições de vida. Na maioria das vezes, estas pessoas são pouco qualificadas e trabalham por uma remuneração muito baixa, o que faz aumentar a desigualdade, já que os salários no setor público em Brasília são altíssimos”, explica.
Dados do IBGE de 2007 indicam que os migrantes ainda constituem a maioria da população residente na região metropolitana de Brasília (51,4%). As pessoas são principalmente oriundas das regiões Nordeste (25,4% da população total) e Sudeste (14,2%) do país.
Na opinião do pesquisador Nunes, a capital brasileira se mostra bastante generosa aos que se fixam nela. “Se a desigualdade na região é analisada desde o ponto de vista geracional, observa-se que os filhos dos que vieram ajudar na construção de Brasília estão hoje em uma condição educacional e, consequentemente, econômica melhor do que seus pais”, afirma.
Iraci Peixoto, coordenadora de estudos e pesquisas da Codeplan, aponta um diferencial entre a população de baixa renda de Brasília e de cidades como Rio de Janeiro e São Paulo. “A desigualdade econômica é grande, mas em Brasília mesmo os cidadãos com poder aquisitivo muito baixo têm acesso à infraestrutura que a região oferece, o que não acontece em outras cidades brasileiras”, assinala.
Como exemplo, Peixoto chama atenção para a taxa de escolarização da capital, que é a mais alta do país. Em Brasília, 98% das crianças entre 7 e 14 anos frequentam a escola. Em consequência, a cidade possui a menor taxa de analfabetismo: enquanto a média nacional é de 8,25%, em Brasília o índice de analfabetos situa-se em 3,37%.
Riqueza e bem-estar
De acordo com números de 2007, a renda per capita do DF (quantidade que cada habitante receberia caso o PIB fosse dividido igualmente entre toda a população) é a mais elevada do país. Enquanto a renda per capita brasileira era de R$ 13.515, a do DF chegava aos R$ 40.696, representando mais que o triplo da média nacional.
Para se ter uma ideia exata das desigualdades existentes na região, a Codeplan situou em um ranking todas as regiões administrativas existentes no DF no ano 2000, com base no IDH dos municípios brasileiros naquele momento. Na ocasião, caso a região administrativa Lago Sul fosse um país independente, seria o de melhor qualidade de vida do mundo, com um índice de 0,945, desbancando a Noruega que, naquele momento, ocupava o primeiro lugar. A região com o pior IDH na época, Brazlândia (0,761), se fosse um país, ocuparia a 90ª colocação no ranking. Ainda assim, ficaria à frente do Brasil (0,757), que ocupava o 93º lugar.
Desde 1991, o DF aparece em primeiro lugar na classificação do IDH elaborado pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) --em 2000, quando foi feito o último estudo, o DF teve uma pontuação de 0,844.
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mede os avanços alcançados por um país em três aspectos: vida longa e saudável (baseado na esperança média de vida ao nascer), acesso ao conhecimento (baseado na alfabetização e na escolarização) e nível de vida digno (baseado no PIB per capita associado ao poder de compra em dólares americanos). Os países são classificados dentro desses aspectos em valores médios entre 0 e 1, sendo que o 0 representa a ausência de desenvolvimento humano e o 1 significa um desenvolvimento humano total.
Das 19 regiões administrativas existentes em 2000, 12 estavam no grupo das regiões consideradas de alto desenvolvimento humano. As outras sete faziam parte do grupo de desenvolvimento humano médio. “Mesmo com as diferenças, nenhuma das regiões [administrativas] estava no grupo de baixo desenvolvimento humano”, afirma Iraci Peixoto.
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Este conteúdo foi publicado em 16/04/2010 no sítio Noticias.uol . Todas as modificações posteriores são de responsabilidade do autor original da matéria.
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